É difícil não notar um grande terremoto, mas antes que ele tome proporções observáveis e algumas vezes catastróficas, estes eventos são precedidos por episódios muito mais sutis, que dadas as condições certas, podem evoluir até os episódios que chamam nossa atenção. Enquanto os grandes terremotos são raros, estas pequenas oscilações imperceptíveis acontecem o tempo todo nas mesmas falhas geológicas, e envolvem os mesmos princípios e mecanismos físicos. Sendo portanto uma fonte muito mais abundante de informação, encontrá-los pode ajudar os pesquisadores a esclarecer o processo de formação de um terremoto, e assim criar ferramentas para predizer os eventos de interesse para a política pública. Mas encontrar estes microterremotos não é fácil. Tradicionalmente, os pesquisadores precisam analisar manualmente os registros das vibrações para separar aquelas causas pelas movimentações tectônicas de outras fontes de ruído como veículos ou multidões em movimento.
Um trabalho da Universidade de Stanford vai facilitar este trabalho. Publicado ano passado, os cientistas apresentaram uma rede neural capaz de detectar e classificar as pequenas oscilações de origem tectônica. Batizado de earthquake transformer, o algoritmo usa mecanismos de atenção para analisar os registros sísmicos, simulando o trabalho dos analistas, que primeiro investigam estes registros de uma forma mais ampla para depois se concentrar em seções menores de interesse.
A inteligência artificial foi treinada com 1 milhão de sismogramas rotulados pelos especialistas, contendo dados coletados nos últimos 20 anos ao redor do mundo, excluindo o Japão. Na fase de teste, foram usados dados contínuos correspondendo a 5 semanas numa região do arquipélago japonês que foi afetada pelo terremoto Tottori no ano 2000. O modelo foi capaz de detectar e localizar mais de 21 mil eventos, número 2,5 vezes maior que aquele identificado pelos especialistas, usando dados de apenas 1/3 das estações disponíveis. Apesar de a precisão ter sido similar entre os dois métodos, a inteligência artificial se mostrou muito mais eficiente e sensível. A maior diferença de performance foi justamente nos eventos mais sutis, que são difíceis de identificar numa análise manual.
Outro benefício óbvio do uso do algoritmo foi o tempo de análise, que sob responsabilidade dos especialistas poderiam levar meses, mas foi realizado em apenas 20 minutos. Isto se deve em parte à estrutura da rede neural desenvolvida, que faz a procura por terremotos e pelo cronograma das fases sísmicas em paralelo, cruzando estas informações de forma hierárquica para chegar na solução mais rapidamente.
Os pesquisadores dizem que, ainda que tenham usado dados históricos para validar a inteligência artificial, já é possível utilizá-la para detectar pequenos terremotos quase tão logo eles aconteçam, e a detecção em tempo real deve ser possível num futuro bem próximo.