Animais produzem sons com diferentes finalidades, sendo uma delas uma forma simples de comunicação. Por isso, os sons da natureza têm muita informação sobre a dinâmica populacional de diferentes espécies dentro de um mesmo hábitat. O estudo dos sons produzidos por animais, chamado de bioacústica, é uma ferramenta muito útil para entender a interação entre indivíduos intra e inter-espécies, tanto em condições normais quanto como resposta a algum evento como uma catástrofe climática. Em vista disso, várias iniciativas de conservação têm instalado microfones em locais selecionados para observar estes fenômenos que, de outra forma, estariam possivelmente inacessíveis.
Mas estudar as gravações é uma tarefa trabalhosa. Mesmo um número razoável de especialistas pode levar um tempo considerável identificando e desvendando sons específicos em poucas horas de registro. Pensando nisso, pesquisadores da Universidade de Cornell, nos Estados Unidos, desenvolveram uma inteligência artificial capaz de acelerar e automatizar esta etapa de investigação.
A primeira grande contribuição do grupo é a publicação da BirdNET, uma rede neural capaz de identificar e classificar vocalizações de aves. Além de permitir o processamento automático das gravações, o algoritmo superou as abordagens anteriores, que se valiam de algumas características dos sons como frequência e duração, as quais são úteis para algumas espécies, mas em outras sua alta variabilidade torna a ideia impraticável. Como é característico de redes neurais, o novo modelo identifica nuances de categorização mais difícil, mas que entregam resultados muito melhores.
O treinamento do sistema foi facilitado já que observadores profissionais e amadores costumam disponibilizar seus registros online. Ainda assim, os dados costumam concentrar informações sobre as regiões onde há mais interesse pela atividade, como a Europa e a América do Norte, o que por enquanto limita as aplicações do algoritmo.
Os pesquisadores estão tentando coletar ainda mais dados com ajuda de observadores amadores na forma de um aplicativo, que é utilizado para identificar o canto de uma ave, mas que também armazena os sons coletados pelos usuários. Atualmente, cerca de 300 mil gravações são realizadas diariamente.
A criação da BirdNET já está criando ramificações. Os cientistas usaram o conhecimento adquirido neste desenvolvimento para criar uma nova inteligência artificial usada para analisar sons produzidos por um gafanhoto no Paraná. Estes sons revelam padrões de atividade de reprodução e variação populacional sazonal úteis, por exemplo, para entender como fenômenos naturais ou causados por humanos podem resultar em uma explosão desta população, o que costuma ser seguido por consequências econômicas relacionadas a lavouras.